A histórica sessão em que Dilma Rousseff foi ao Senado na condição de ré para se defender pessoalmente das acusações que sofre no processo de impeachment foi encerrada às 23h47min de terça-feira, depois de mais de 14 horas, com pausa de duas horas, de alegações da presidente afastada e de inquirições feitas pelos parlamentares.

Quando a petista encerrou o espaço de considerações finais, foi aplaudida pelos seus apoiadores que estavam no plenário. Ela retribuiu o gesto e distribuiu alguns cumprimentos antes de se retirar.O dia ficou marcado pelo cumprimento da penúltima etapa do julgamento final de Dilma.

Nesta terça-feira, a partir das 10h, os senadores se reúnem para o último ato. Cada um terá 10 minutos para se manifestar e, depois, será feita a votação, que poderá ocorrer na madrugada de quarta-feira.

Discurso
Da tribuna do Senado, a presidente afastada Dilma Vana Rousseff escreveu um novo capítulo da inflamada história da política nacional ao se defender do impeachment que deverá abreviar a sua passagem pelo poder. Em 46 minutos de discurso, prevaleceu a versão de vítima de um “golpe”, o tom político e emocional, com minucioso resgate de seu passado. No ponto alto da retórica, ela se emocionou ao citar as torturas sofridas sob o regime militar e a luta contra um câncer. No plano técnico, reafirmou sua inocência por crime de responsabilidade. No processo deflagrado em dezembro de 2015, Dilma é acusada de ter editado decretos de suplementação orçamentária sem autorização do Congresso e de atrasar repasses a bancos públicos para maquiar resultados fiscais.

— No presidencialismo previsto em nossa Constituição, não basta a eventual perda de maioria parlamentar para afastar um presidente. Há que se configurar crime de responsabilidade. E está claro que não houve tal crime. Quem afasta o presidente pelo conjunto da obra é o povo e, só o povo, nas eleições — sustentou Dilma.

Consciente de que dificilmente irá evitar o impeachment, Dilma fez um discurso contundente e, se evitou citar o nome de seu vice e presidente interino, Michel Temer, por reiteradas vezes atribuiu o afastamento à disposição de não ceder às chantagens do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Em referência indireta a Temer, Dilma disse que o impeachment “resultará na eleição indireta de um governo usurpador”. Como planejado em reuniões no Palácio da Alvorada, ela mandou um recado cifrado a ex-ministros que, agora, estão inclinados a votar a favor da sua deposição, entre eles Edison Lobão (PMDB-MA), Eduardo Braga (PMDB-AM) e Marcelo Crivella (PRB-RJ).

— Se alguns rasgam o seu passado e negociam as benesses do presente, que respondam perante a sua consciência e perante a história pelos atos que praticam. A mim cabe lamentar pelo que foram e pelo que se tornaram — afirmou.

Dilma começou o pronunciamento lembrando que foi eleita por 54 milhões de votos. Citou trechos do juramento de posse, no qual jurou cumprir a Constituição, mas reconheceu ter descumprido promessas de campanha.

— Posso ter cometido erros e não ter alcançado o que esperavam de mim — admitiu Dilma ao ser inquirida por Aécio Neves (PSDB-MG), após o término de sua manifestação inicial.

A petista, aliás, reafirmou que os adversários não aceitaram o resultado das urnas, partindo para suposta trama ardilosa, na qual o julgamento não respeita o devido processo legal.

— Lamento que o senhor não cumpra os mínimos princípios. Fico estarrecida — disse Dilma, questionando manifestações prévias a favor do impeachment por parte de seus julgadores, em duro embate com o senador José Aníbal (PSDB-SP), que conhece a presidente há 50 anos e também militou em organizações clandestinas nos tempos de ditadura.

Em vários momentos, Dilma comparou o processo de impeachment ao período em que foi presa e torturada, no final dos anos 1960, por combater a ditadura militar. Pela segunda vez, declarou, a democracia estava sentada com ela no banco dos réus, e apelou à consciência dos senadores ao prever que “todos seremos julgados pela história”.

Com os olhos marejados, a petista disse duas vezes ter encarado a face da morte, “quando fui torturada por dias seguidos, submetida a sevícias que nos fazem duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida; e quando uma doença grave e extremamente dolorosa poderia ter abreviado minha existência”. Num último apelo, se dirigiu aos indecisos, pontuando que a deposição exige crime cometido de forma intencional, o que alega não ter feito.

— Façam justiça a uma presidenta honesta, que jamais cometeu qualquer ato ilegal, na vida pessoal ou nas funções públicas que exerceu. Peço: votem contra o impeachment. Votem pela democracia — suplicou.

Na fase de perguntas, aliados pediam que Dilma falasse das políticas públicas e programas sociais do governo, enquanto os adversários rebatiam a tese do golpe.

— Golpe com a supervisão do Supremo Tribunal Federal? O STF é o órgão a quem compete, em última instância, a guarda da Constituição. João Goulart não tinha a quem recorrer. A senhora tem — rebateu Aloysio Nunes (PSDB-SP), após Dilma comparar sua possível deposição às quedas de Jango e de Getúlio Vargas.

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