O dia 10 de agosto de 2016 pode ter se tornado um divisor de águas na vida de Giovana Scarpelli. Foi quando ela fez o seu primeiro treino no América-MG, o único time profissional de futebol feminino do estado. “Estou nervosa porque não sei se estou no nível técnico das jogadoras”, confessou antes do teste. A expectativa era tanta que ela chegou com bastante antecedência ao Complexo Esportivo do Aglomerado da Serra e aguardou a chegada do restante da equipe.

Natural de Belo Horizonte, Giovanna Scarpelli tem 17 anos, é estudante e pratica esporte desde criança. Por três anos, integrou as categorias de base do time de vôlei do Minas Tênis Clube. Futebol, jogava apenas por hobby com amigas, o que não era uma prática regular. Foi somente quando ela fez um intercâmbio escolar nos Estados Unidos que ganhou a oportunidade de desenvolver o esporte que mais lhe dá prazer. “Fiquei lá um ano e, durante todo esse período, defendi o time da minha escola nas competições. Encontrei lá o estímulo que não havia tido no Brasil. Aqui não tive opções”, conta.

De volta ao país, a mineira resolveu que era hora de se arriscar. Sem a facilidade de acesso à prática do esporte no ambiente escolar, buscou ela mesma desbravar os caminhos. Giovanna passará por mais alguns dias de teste até a decisão final da comissão técnica do América-MG. O treinador do time, Victor Alberice, havia elogiado seu porte físico. “Não temos atletas com essa altura. Se der certo, será muita bem-vinda ao elenco”. O 1,80 metro da possível nova jogadora, de fato, chamava a atenção no treino.

A trajetória de Giovanna revela o retrato do futebol feminino em Minas Gerais, realidade que não difere muito de outros estados. Faltam oportunidades para que sejam encontrados os talentos entre as jovens do país. A maioria dos times não tem equipe de base. As meninas que ainda não têm idade para integrar o time principal acabam ficando sem opções. Enquanto isso, em países como os Estados Unidos, a Austrália, a Suécia e Noruega as jovens são descobertas na escola, participam de competições e vivem um processo de desenvolvimento que não existe no Brasil. As que se destacam são absorvidas pelos times das universidades, que também oferecem bolsas de estudo às jogadoras.

Profissionalização
O América-MG montou seu time de futebol feminino profissional no início deste ano. É o primeiro da história de Minas, o mesmo estado que sediará hoje (12) um momento histórico da modalidade: no Mineirão, a seleção brasileira enfrentará a Austrália em partida válida pelas quartas de final das Olimpíadas de 2016.

Entre os três principais clubes de Belo Horizonte, apenas o América tem time feminino. O Cruzeiro e o Atlético já tiveram equipes amadoras no passado, mas foram extintas. O elenco feminino atleticano foi desmontado em 2013 e várias de suas jogadoras migraram para o América.

A estruturação de equipes femininas profissionais é uma exigência do Profut, programa aprovado pelo governo federal no ano passado que estabelece requisitos para que os maiores clubes do país parcelem suas dívidas com o estado. No entanto, as iniciativas ainda são isoladas. Corinthians, Flamengo, Santos e Santa Cruz estão entre os times de Série A que já se adaptaram.

“É preciso estabelecer um modelo contratual que permita a essas meninas viver do futebol. Hoje, elas crescem jogando por conta própria. O prazo para cumprimento dessa cláusula do Profut era até agosto deste ano, mas foi prorrogado para o ano que vem. Acredito que, no Brasil todo, não existam dez equipes profissionais. A maioria dos times femininos não assina carteira e nem paga os encargos trabalhistas”, diz o treinador do América, Victor Alberice.

O investimento dos clubes da Série A é também cobrado pela atacante do clube mineiro Kamila Chaves, de 23 anos. “Eu acho que as coisas estão melhorando. Antigamente não tínhamos nem metade do que temos hoje. Mas ainda há muito o que evoluir e sem o apoio dos times de camisa fica complicado”, diz a jogadora, que já defendeu a seleção brasileira sub-17 e, recentemente, foi artilheira da Taça BH com 22 gols.

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